Cidades como arenas culturais: os serviços públicos e o HIP HOP

Boletim nº 86, 07 de maio de 2025

 

Renata Bastos da Silva

Profa do IPPUR/UFRJ

Colaboram: Beatriz Silva Soares, Débora Gualtieri, João Vitor do Nascimento, Jonathan Vitor da Silva Pinheiro, Luis Felipe Tavares da Silva, Maria Gabriella Cardoso, Meire Daiana Thais da Silva Moreira, Michaely Alves de Souza, Nícolas Jofre Garuba – Discentes do GPDES e de Ciências Econômicas (UFRJ). 

 

A disciplina Cidade e Cultura faz parte de nosso projeto de pesquisa e extensão, intitulado: Núcleo de estudos Vida Pública: os temas republicanos nos espaços escolares e de ensino e é oferecida desde o segundo semestre de 2023, no curso de Gestão Pública para o Desenvolvimento Econômico e Social (GPDES) do IPPUR.,. Tanto o projeto de extensão quanto a disciplina são coordenados pela professora Renata Bastos e organizados por discentes da UFRJ, em especial do GPDES. 

 No dia 01 de novembro de 2024, tivemos o prazer de, com os jovens do nosso curso GPDES, debater sobre o tema dos serviços públicos junto a um grupo de jovens da comunidade da Rocinha. Patriny Costa,  Everton Rodrigues Dos Santos e Jonny Katram de Mendonça Roxo, são jovens da comunidade e organizam a Batalha de Moscow, batalha de rap que acontece às primeiras sextas-feiras do mês, na  Rua 4, pracinha de Moscow. As batalhas de rap são uma manifestação cultural do contexto do Hip Hop, iniciada nos anos 1970 em diversos lugares, em especial na Jamaica, que apresenta o ritmo estilizado que comumente acompanha o rap; uma fala rítmica e rimada que é cantada, na qual os jovens expõem inquietudes sobre seu cotidiano e seu país. Assim, em articulação  com Patriny Costa, combinamos e apresentamos os pôsteres confeccionados pelas e pelos jovens estudantes da nossa UFRJ durante o evento, de modo a inspirar os jovens em suas rimas de Hip Hop. 

Os serviços públicos apresentados em Pôster

Durante a  29ª edição da Semana IPPUR, que aconteceu entre os dias 7 e 11 de outubro de 2024, no edifício Jorge Machado Moreira, Cidade Universitária da UFRJ, Rio de Janeiro, estudantes, professores e especialistas se reuniram para discutir temas relacionados à gestão pública, políticas urbanas e sustentabilidade. No dia 9 de outubro, das 16h30 às 18h, os alunos de diversos cursos da UFRJ, que participaram das atividades de ensino, pesquisa e extensão do Núcleo de Estudos Vida pública: os temas republicanos nos espaços escolares e de ensino sob a orientação da Professora Renata Bastos, apresentaram seis pôsteres que abordaram temas relacionados aos serviços públicos, em especial ao Marco do Cuidado. A seguir, falamos sobre os trabalhos expostos na semana IPPUR, destacando reflexões sobre a vida pública, as obras de Neruda e Benavides, a trajetória da Revista Versus, as políticas públicas do cuidado, a atuação do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) em face ao Coronavírus e propostas para uma cultura sustentável que promova a interação harmônica entre o Rio de Janeiro e o meio ambiente.

O bolsista FAPERJ e discente do GPDES, Luis Felipe Tavares, apresentou um pôster que explorou o tema Vida Pública: Como os temas republicanos impactam a integração de crianças refugiadas nos espaços escolares e de ensino do Estado. O projeto destacou o uso do livro Doçura (2022), de Anna Cunha e Emília Nuñez, como ferramenta para aprofundar a proposta de imersão das crianças no tema do acolhimento. A iniciativa foi realizada com o apoio da Escola Municipal Capistrano de Abreu (RJ) e envolveu atividades práticas, como plantio de mudas e discussões sobre empatia e diversidade, promovendo uma integração significativa entre alunos e a comunidade escolar. Além disso, a dupla Tiago Soares e Brenda Cássia de Lima elaboraram um pôster focado nas obras de Pablo Neruda e Washington Benavides, destacando suas contribuições para a construção da identidade cultural latino-americana. O pôster explorou, de forma dinâmica, as temáticas abordadas pelos autores, como amor, melancolia e resistência, ressaltando também a musicalidade presente na obra de Benavides, que aproxima sua poesia da cultura brasileira. Esta apresentação reforçou a importância da arte como ferramenta de integração e reflexão social, evidenciando como os valores compartilhados entre diferentes culturas podem fortalecer os laços entre os países da América Latina e enriquecer o debate artístico e educativo nas instituições públicas.

Nayane Cristina e Kelly Menezes, ambas bolsistas PROFAEX, apresentaram um pôster sobre a 11ª edição da Revista Versus, do Centro de Ciências Jurídicas e Econômicas (CCJE) da UFRJ. Esta edição, com o tema “Serviços Públicos”, temdestaque para a celebração dos 35 anos da Constituição de 1988, e chama a atenção pela integração entre arte, design gráfico e conteúdo editorial. A revista busca proporcionar uma experiência de leitura envolvente, com uma hierarquia clara de textos e uma paleta de cores alinhada ao tema. Além disso, a Galeria Versus foi integrada para expor obras de arte que dialogam com o conteúdo. O trabalho de Nayane e Kelly analisa a edição da revista a partir de uma abordagem qualitativa, investigando como cores, tipografias e layout enriquecem a narrativa, demonstrando como a revista equilibra texto e imagem, criando uma comunicação clara e estética que estabelece novos padrões no design editorial acadêmico.

Um grupo de sete discentes da UFRJ apresentou o pôster “Políticas Públicas do Cuidado”, ressaltando a importância do cuidado nas políticas voltadas para mulheres. Em parceria com a Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres do Rio de Janeiro (SPM-Rio), o projeto incluiu visitas à Casa da Mulher Carioca Tia Doca e ao CEAM – Centro Especializado em Atendimento à Mulher – Chiquinha Gonzaga, proporcionando uma compreensão prática dos desafios do atendimento a mulheres em situação de vulnerabilidade. Além das visitas, seminários e palestras, como a do Mapa da Mulher Carioca, aprofundaram discussões sobre feminicídio, mercado de trabalho e mortalidade materna. Com essas experiências, o grupo reforçou a relevância do cuidado como um compromisso republicano, essencial para uma gestão pública mais humanizada e eficaz, promovendo a autonomia e dignidade das mulheres.

Os alunos João Pedro Alves, Anna Paola, Rebeca Maria e Vitória Gomes discutiram sobre o “Sistema Único de Assistência Social e a Pandemia da COVID-19”. A pesquisa buscou avaliar como o município do Rio de Janeiro revisou seus planos de ação do SUAS diante da pandemia, seguindo as portarias emitidas pela Secretaria Nacional de Assistência Social (SNAS). Desde agosto de 2024, o grupo tem conduzido trabalhos de campo, aplicando um questionário baseado no método survey para profissionais da Proteção Social Básica. A pesquisa revelou fragilidades tanto na infraestrutura dos CRAS quanto na disponibilidade tecnológica. Além disso, o questionário foi ajustado em colaboração com a assistente social Ellen Cristina Pereira Zacarias, visando atender às demandas específicas da Secretaria Municipal de Assistência Social (SMAS). Com aprovação ética pela Plataforma Brasil e apoio da SMAS, o estudo segue investigando as condições e práticas durante a pandemia, com o objetivo de contribuir para futuras políticas públicas mais eficazes em momentos de crise.

Por fim, o pôster “Rio de Janeiro: A Capital do G20 e a construção, com os cidadãos, de uma cultura sustentável de interação com o Meio Ambiente” foi apresentado, destacando a importância de envolver a sociedade em práticas sustentáveis. Com foco nas políticas públicas necessárias para enfrentar os desafios do “capitalismo de desastres”, o projeto discutiu como a tecnologia e a gestão pública podem mitigar os impactos ambientais, especialmente em um contexto urbano como o do Rio de Janeiro, que se preparava para sediar a Cúpula do G20 em novembro de 2024.

A exposição dos pôsteres na Rocinha

Levamos os pôsteres descritos acima para os jovens do grupo de Hip Hop conhecerem as pesquisas realizadas pelos jovens da UFRJ. Salientamos que a confecção dos mesmos foi orientada pela professora e realizada pelos discentes, após debates democráticos e republicanos com nossas e nossos jovens da UFRJ, abordando questões sociais, culturais e ambientais, com a participação ativa dos mesmos expositores.

Portanto, voltando ao relato de nossa participação na atividade cultural na Rocinha, destacamos alguns jovens da UFRJ que fizeram a apresentação dos seis pôsteres aos jovens do Hip Hop. Beatriz Soares, Maria Gabriella e Michaely Alves exploraram temas relacionados às políticas públicas de Cuidado, enquanto Vitória Gomes discutiu o impacto da pandemia, como já aludido, de COVID-19 no Sistema Único de Assistência Social (SUAS). Com o apoio de outros membros do grupo, apresentamos também o papel do Rio de Janeiro no G20 e a construção de uma cultura sustentável. Em outro momento do evento, Luis Felipe Tavares abordou, como já mencionamos, temas ligados à inclusão de crianças refugiadas e imigrantes nas atividades da escola municipal Capistrano de Abreu e contribuiu juntamente com a Professora Renata Bastos para a análise cultural sobre os poetas Neruda e Benavides. Houve ainda uma apresentação dedicada à revista Versus, também já aludida acima, que trouxe reflexões sobre a cultura. O evento mesclou apresentações acadêmicas e a música Hip Hop de MCs, permitindo uma interação rica entre os alunos e os moradores da comunidade. Durante a visita, os alunos se dividiram em tarefas: apresentaram os cartazes, ajudaram em questões logísticas e mantiveram conversas com a professora sobre o melhor aproveitamento do evento. Uma parte muito interessante foi a conversa informal com os presentes, incluindo organizadores, MCs e espectadores. Um dos organizadores destacou que “a cultura salvou minha vida”, ressaltando que os MCs que participaram não eram apenas da Rocinha, mas de várias partes do Rio, incluindo a Baixada.1

As reações dos moradores foram muito positivas; muitos elogiaram a presença da UFRJ na comunidade, afirmando que alguns nunca haviam tido acesso aos conteúdos apresentados. Patrícia, uma das organizadoras da atividade na pracinha de Moscou, expressou sua satisfação por aquele momento, desejando ver os MCs se apresentando em espaços como o Teatro Municipal no futuro. Por outro lado, alguns MCs relataram a dificuldade de contar com apoio para promover a roda cultural.

Além dos momentos de descontração quando vimos o Hip Hop acontecer, a interação entre os jovens da comunidade e os jovens universitários se tornou um momento de ensino mútuo. No final da apresentação das rimas, o ganhador levou para casa o livro Lincoln e a Princesa Isabel: o ensino de duas experiências de abolição da escravidão nas Américas através da Literatura. Jundiaí(SP): Paco, 2023, de autoria da profa Renata Bastos da Silva.

Para os estudantes universitários, projetos que levam a Universidade para além dos seus muros são fundamentais para a formação de futuros gestores públicos, ocupando espaços muitas vezes negligenciados pelas políticas públicas, mas ricos em cultura e talentos. Ao final da atividade cultural, todos puderam confraternizar e tirar fotos juntos, reconhecendo o grande proveito que o evento proporcionou a todos os envolvidos.

Por fim, vale ressaltar que a importância da comunicação enquanto  base de uma troca de saberes na ação social, enquanto o foco de nossa visita era compartilhar informações produzidas pelo grupo, através da criação de um elo e com zelo à comunidade. A ação de extensão fomentou uma troca cultural entre os alunos da UFRJ e a comunidade, considerando a realidade de cada grupo e pessoas presentes ali. 

Nesse  semestre a a disciplina Cidade e Cultura, de caráter teórico e de extensão, está sendo ofertada novamente e deve contar com P duas aulas-visita: uma na Praça Saens Peña, um antigo polo cultural, em especial de cinema, que foi desfigurado com o tempo; e outra uma caminhada pela Urca, cenário do filme “Ainda estou Aqui” (2024).

[1] COSTA, Patriny. UFRJ & Batalha de Moscow – Rocinha. Instagram: Disponível aqui. Acesso em: 15.mar. 2025. 1 vídeo. (2 min).