Planejamento orçamentário e Gestão Pública: análise do caso de Pirassununga

Boletim nº 87, 09 de junho de 2025

Lucas Mendes

Pós-graduando em Gestão Pública pelo IPPUR

 

Introdução
O cenário público brasileiro apresenta desafios complexos para gestões municipais, especialmente em cidades de porte médio. Durante anos, municípios enfrentam problemas decorrentes de descontinuidade administrativa, fragilidades na arrecadação tributária e baixa eficiência na execução de políticas públicas. 

O planejamento orçamentário desempenha um papel crucial na gestão pública, servindo como ferramenta para a alocação eficiente de recursos e a garantia da sustentabilidade fiscal dos municípios. Através do orçamento, o governo define suas prioridades, estabelece metas e aloca recursos para a execução de políticas públicas. No entanto, a eficácia desse processo depende da precisão das projeções de receita e da disciplina na execução das despesas. Quando o planejamento orçamentário é falho, com projeções irreais e falta de controle, a gestão pública pode enfrentar sérias dificuldades, comprometendo a qualidade dos serviços prestados à população e a capacidade de investimento em áreas estratégicas. 

Um planejamento orçamentário eficiente deve ser baseado em dados concretos, metodologias sólidas e uma análise realista do cenário econômico. A administração municipal deve adotar práticas transparentes e participativas, envolvendo a sociedade civil e os órgãos de controle no processo de elaboração e acompanhamento do orçamento. Além disso, o legislativo municipal tem um papel fundamental na fiscalização do orçamento, garantindo que as projeções sejam realistas e os recursos sejam utilizados de forma responsável e eficiente. 

Neste contexto, o presente artigo se propõe a analisar o caso de Pirassununga, demonstrando como um planejamento orçamentário inadequado pode gerar impactos negativos na gestão pública e quais medidas podem ser adotadas para reverter esse cenário. Este estudo utiliza uma abordagem qualitativa, baseada em análise do portal transparência da cidade de Pirassununga, plano de 100 dias e relatórios produzidos pela equipe de transição da gestão municipal de Pirassununga. Além disso, foram incorporadas referências teóricas sobre planejamento estratégico e gestão pública, alinhando os resultados às boas práticas recomendadas.

 

O caso de Pirassununga: superestimação de receitas na LOA 

Nos últimos anos (2020-2024), a gestão municipal de Pirassununga tem adotado uma prática recorrente de superestimar receitas na Lei Orçamentária Anual (LOA). Essa estratégia consiste em projetar um montante de arrecadação superior ao que efetivamente se espera obter, criando uma falsa impressão de disponibilidade orçamentária. Embora essa prática possa parecer vantajosa a curto prazo, ela gera uma série de impactos negativos na gestão pública, comprometendo a capacidade de execução de políticas públicas essenciais e a credibilidade das contas públicas. A superestimação de receitas pode ser motivada por diferentes fatores, como o desejo de apresentar um orçamento mais ambicioso, a pressão para atender a demandas sociais e políticas, ou a falta de rigor técnico na elaboração das projeções. No entanto, independentemente das motivações, essa prática sempre resulta em um descasamento entre a previsão e a arrecadação, gerando dificuldades no cumprimento de despesas essenciais, como saúde, educação e infraestrutura. Além disso, a superestimação de receitas pode levar ao endividamento do município, uma vez que a gestão pode recorrer a operações de crédito para suprir a falta de recursos, comprometendo o equilíbrio fiscal futuro. Essa situação pode se agravar ainda mais caso a arrecadação real seja inferior à esperada, gerando um círculo vicioso de endividamento e dificuldades financeiras. 

 

Impactos do planejamento orçamentário irrealista 

 

Déficit orçamentário: A principal consequência da superestimação de receitas é o déficit orçamentário, que ocorre quando as despesas superam as receitas. Essa situação gera dificuldades no cumprimento de obrigações financeiras, como o pagamento de salários de servidores, fornecedores e prestadores de serviços. O déficit orçamentário pode comprometer a qualidade dos serviços públicos, gerar atrasos em obras e projetos, e aumentar a insatisfação da população. 

Endividamento público: Para suprir a falta de recursos, a gestão municipal pode recorrer a operações de crédito, como empréstimos e financiamentos. No entanto, o endividamento excessivo pode comprometer o equilíbrio fiscal futuro, uma vez que o município terá que destinar parte de sua receita para o pagamento de juros e amortizações. Além disso, o endividamento pode limitar a capacidade de investimento em áreas estratégicas, como infraestrutura e desenvolvimento econômico. 

Redução da capacidade de investimento: Com receitas menores que o previsto, projetos estratégicos acabam sendo adiados ou cancelados. Essa situação pode comprometer o desenvolvimento socioeconômico do município, uma vez que a falta de investimento em áreas como infraestrutura, educação e saúde pode gerar impactos negativos na qualidade de vida da população e na competitividade da economia local. 

 

Papel do legislativo municipal na aprovação da LOA 

 

O Legislativo municipal desempenha um papel crucial na aprovação da Lei Orçamentária Anual (LOA), sendo responsável por analisar e deliberar sobre as projeções de receita e as dotações de despesa propostas pela administração municipal. Nesse sentido, os vereadores devem atuar como fiscais do orçamento, garantindo que as projeções sejam realistas e compatíveis com a capacidade arrecadatória do município, e que os recursos sejam alocados de forma eficiente e transparente. 

 

No entanto, a conivência ou omissão dos vereadores em relação a projeções irreais pode permitir que as administrações utilizem o orçamento de forma irresponsável, comprometendo a governabilidade das futuras gestões. A ausência de um debate aprofundado e técnico na Câmara Municipal evidencia a fragilidade institucional no processo de planejamento orçamentário, abrindo espaço para a aprovação de orçamentos inflados e a utilização inadequada dos recursos públicos. Para que o Legislativo municipal possa exercer seu papel fiscalizador de forma eficaz, é fundamental que os vereadores tenham acesso a informações precisas e transparentes sobre as finanças do município, e contem com o apoio de técnicos e especialistas em orçamento público. Além disso, é importante que a Câmara Municipal promova debates públicos sobre o orçamento, envolvendo a sociedade civil e os órgãos de controle no processo de acompanhamento da execução fiscal. Esses debates podem auxiliar os vereadores a identificar as prioridades da população e a garantir que os recursos sejam alocados eficientemente e em benefício da coletividade.

 

Para fortalecer o protagonismo do Legislativo na avaliação das peças orçamentárias, a Câmara Municipal pode criar comissões permanentes de orçamento e finanças, promover cursos de capacitação para os vereadores sobre orçamento público, e estabelecer parcerias com universidades e centros de pesquisa para a realização de estudos e análises sobre as finanças do município. 

 

Desafios para a nova gestão de Pirassununga (2025-2028): 

Reorganização das finanças municipais: A nova gestão de Pirassununga enfrentará grandes desafios para reorganizar as finanças municipais diante do cenário de superestimação de receitas e dificuldades financeiras. Para reverter essa situação, será necessário adotar uma série de medidas, visando aprimorar o planejamento orçamentário, aumentar a transparência e o controle social, e garantir a utilização eficiente dos recursos públicos. A principal ação deve ser a revisão da LOA e seu alinhamento as receitas e projeções realistas, é fundamental que a nova gestão revise a Lei Orçamentária Anual (LOA) e ajuste as projeções de receita, considerando a arrecadação efetiva dos últimos anos e as perspectivas para o cenário econômico futuro. Essa medida é essencial para evitar o déficit orçamentário e garantir o cumprimento das obrigações financeiras do município. 

 

Transparência e controle social no planejamento orçamentário 

A transparência e o controle social são elementos essenciais para garantir a eficiência e a responsabilidade na gestão pública. No contexto do planejamento orçamentário, a transparência implica a divulgação de informações claras e acessíveis sobre as finanças do município, permitindo que a população e os órgãos de controle acompanhem o processo de elaboração e execução do orçamento. O controle social, por sua vez, se refere à participação da sociedade civil na fiscalização dos gastos públicos, garantindo que os recursos sejam utilizados eficientemente e em benefício da coletividade. Para ampliar a transparência e o controle social no planejamento orçamentário, a administração municipal pode adotar diversas medidas, como a criação de portais da transparência, a realização de audiências públicas sobre o orçamento, a divulgação de relatórios de execução orçamentária, e o incentivo à participação da sociedade civil em conselhos e comissões de fiscalização. Além disso, é importante que a população tenha acesso a informações sobre os principais indicadores socioeconômicos do município, como o índice de desenvolvimento humano (IDH), a taxa de pobreza, a taxa de desemprego e os indicadores de saúde e educação. Essas informações podem auxiliar a sociedade civil a avaliar o desempenho da gestão pública e a identificar áreas prioritárias para o investimento de recursos. 

 

Recomendações para um planejamento orçamentário responsável e eficiente 

Adotar metodologias sólidas e dados concretos: O planejamento orçamentário deve ser baseado em metodologias sólidas e em dados concretos, evitando projeções otimistas e irrealistas. É importante que a administração municipal conte com o apoio de técnicos e especialistas em orçamento público, que auxiliem na elaboração de projeções precisas e na identificação de oportunidades de melhoria na gestão fiscal. Ampliar a transparência e o controle social: A população e os órgãos de fiscalização devem acompanhar o processo orçamentário, desde a elaboração até a execução. A administração municipal deve disponibilizar informações claras e acessíveis sobre as finanças do município, promover debates públicos sobre o orçamento e incentivar a participação da sociedade civil no controle social dos gastos públicos. 

Fortalecer o protagonismo do Legislativo: A Câmara Municipal deve exercer seu papel fiscalizador com mais rigor, evitando a aprovação de orçamentos inflados e garantindo um planejamento mais responsável. Os vereadores devem ter acesso a informações precisas e transparentes sobre as finanças do município, e contar com o apoio de técnicos e especialistas em orçamento público para analisar as peças orçamentárias e acompanhar a execução fiscal. 

Priorizar o investimento em áreas estratégicas: O orçamento deve priorizar o investimento em áreas estratégicas para o desenvolvimento socioeconômico do município, como educação, saúde, infraestrutura e saneamento básico. É importante que a administração municipal defina metas claras e mensuráveis para essas áreas, e acompanhe de perto a execução dos projetos e programas. 

Rumo a uma gestão pública municipal sustentável 

A análise do caso de Pirassununga demonstra como um planejamento orçamentário equivocado pode comprometer a gestão pública municipal. A superestimação de receitas, a falta de transparência e controle social e a omissão do Legislativo podem gerar déficit orçamentário, endividamento público, redução da capacidade de investimento e crise de credibilidade. Para reverter esse cenário, é fundamental que a nova gestão adote um modelo orçamentário baseado na realidade financeira do município, garantindo maior previsibilidade, transparência e eficiência na aplicação dos recursos públicos. O Legislativo deve exercer seu papel fiscalizador com mais rigor, evitando a aprovação de orçamentos inflados e garantindo um planejamento mais responsável. Além disso, a sociedade civil deve ser envolvida no processo de acompanhamento da execução fiscal, cobrando transparência e responsabilidade dos gestores públicos. Para que futuras administrações consigam reverter esse cenário, será essencial estabelecer um modelo orçamentário baseado na realidade financeira do município, garantindo maior previsibilidade, transparência e eficiência na aplicação dos recursos públicos. Ao adotar essas medidas, Pirassununga poderá trilhar um caminho rumo a uma gestão pública municipal sustentável, capaz de promover o desenvolvimento socioeconômico e melhorar a qualidade de vida da população.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. Portal da Transparência da Prefeitura de Pirassununga. Disponível em: https://www.pirassununga.sp.gov.br/transparencia. Acesso em: 26/11/2024.

ESCOLA NACIONAL DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA (ENAP). Curso de Gestão Municipal: Planejamento e Governança. Brasília: ENAP, 2024. Disponível em: https://www.escolavirtual.gov.br. Acesso em: 11/12/2024.

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Indicadores Econômicos e Sociais de Pirassununga. Disponível em: https://www.ibge.gov.br. Acesso em: 26/01/2025.